segunda-feira, 2 de setembro de 2019

# narcose



                                                    "Seremos sós entre esqueletos de petróleo e giz "
(Evandro Camperon)


onde

seus olhos

mãos, boca

posso vê-los

derretidos

na paisagem 

sem beleza

somos sem-olhos e também sem-narizes

e o paladar se foi antes da paisagem

mas fechar os olhos nunca

um ver-chumbo, um ver-pólvora

um ver-sangue seco

não sinto o paladar desde aquele

aluvião 

desde então pesadelo

narcose

não é só abrir os olhos

imbecil 

aplacar a fome

isso faz tempo que não

é sempre um roer de ossos

pedra pau 

come-se e descobre-se a morte 

mesmo assim todos se atiram à comida

a fome se impõe 

somos tíbios

temos fome

é difícil afirmar 

já fomos melhores

dizem

ou era apenas um ter-narizes

ter-olhos ter-bocas

só falamos

nem isso

comer e beber

quase animalizados

nem isso

quase robôs

nem isso

chusmas de dúvidas

ecos de esquecimentos

palavra envenenada

olhos manchados

nos pensavam deuses

nos sabemos monstros

cala essa boca

imbecil


# São Paulo, 1º de setembro de 2019



(Fuente: weheartit.com, vía cocaine-kay)



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